5 de dezembro de 2017 – Povoado Cana-Brava, Município de Maranhão

Bom dia, pessoal! Desculpem a falta de entradas durante estes últimos dias; eu tenho estado muito mais ocupado do que antes imaginava, graças ao Ze’e e ao resto da comunidade. Tem sido uma semana bastante instrutiva, tanto para a minha pesquisa como para o meu objetivo de conhecer melhor este povo, e estou empolgado para compartilhar as minhas histórias com vocês!

Eu passei os primeiros dias da semana aprendendo mais sobre o sistema agrícola do qual estes fazendeiros participam. Infelizmente, como expliquei na minha última entrada, ainda não está na época de colheita. Por isso, depois dum crash course (como dizem os Americanos!) sobre os seus produtos importantes, vi de primeira mão como esses bens são vendidos. O André, um agricultor que vive em Cana Brava, levou-me a vários destinos perto da aldeia onde ele normalmente troca as suas mercadorias; paramos em todo o tipo de lugar, duma cabana isolada no meio do mato a Tutóia, uma cidade ribeirinha que depende dos seus vizinhos para arroz, mandioca, e outros bens comerciais.[1] Foi interessante observar as interações entre o André e os membros destas comunidades; apesar de não pertencerem ao mesmo grupo, existe uma relação simultaneamente amável e respeitosa entre todos, talvez devido à vida semiperiférica que eles compartilham.

Nos dias seguintes, entretanto, mudamos de temática. Quando falamos a semana passada, o Ze’e notou o meu interesse na “experiência Guajajara”. Por isso, ele resolveu ajudar-me a aprender um pouco mais sobre a cultura, começando com a língua. Segundo ele, muitos Guajajara sabem falar português (ainda bem, se não eu estaria numa situação difícil!); este idioma serve como uma língua franca, principalmente nos negócios comerciais.[2] Mas, ao mesmo tempo, também têm uma língua utilizada exclusivamente entre eles. Esta foi o idioma que eu comecei a aprender.

Nós começamos com elementos básicos: bom-dia (çané cuêm), boa-noite (çané caroc), e outras frases uteis para qualquer visitante na comunidade.[3] Esta língua não tem nada a ver com o português nem com o inglês, então esta primeira parte foi bastante difícil. De vez em quando, para variar um pouco, ele mostrava-me alguns documentos traduzidos para o Guajajara, o mais interessante sendo uma copia da Bíblia Sagrada.[4] Isto levou a outra transição em foco; depois de uns dias praticando o idioma da comunidade, comecei a aprender um pouco sobre a sua fé também!

Antes do colonialismo, 100% dos Guajajara participavam no mesmo sistema cosmológico, o qual segue um formato típico entre os povos Tupi-Guarani. Como outras tribos deste grupo, os Guajajara acreditam em Maíra, um deus que criou a raça humana e os espíritos e seres sobrenaturais chamados de karowara.[5] Nesta época, ainda havia uma ênfase notável no ritual e no xamanismo; infelizmente, os portugueses trouxeram a sua religião consigo quando vieram para cá. Hoje em dia, 60% da população considera-se cristã, enquanto os outros 40% (que inclui o Ze’e e a sua tribo) ainda seguem a tradição original.[6] Por acaso, ele hoje convidou-me a participar na awashire-wehuhau, a Festa do Milho, quando chegar a época das chuvas; a melhor forma de aprender é através da ação, então esta será uma experiência bastante informativa.

Bem, estes últimos dias foram cansativos, mas a próxima semana será até mais cheia! Fui convidado para uma reunião dos caciques do Maranhão e o Ze’e prometeu introduzir-me a eles todos! Antes disso, entretanto, preciso descansar e refletir um pouco sobre estas primeiras semanas. Eu não sei até que ponto estas experiências vão ajudar-me a escrever a minha tese, mas eu sei uma coisa de certeza: eu estou ansioso para ver até onde o resto do meu tempo entre os Guajajara vai levar-me. Até já!

 

Bibliografia:

  1. “Guajajara.” Language Museum. Accessed October 18th, 2018. http://www.language-museum.com/encyclopedia/g/guajajara.php.
  2. “Guajajara.” Povos Indígenas do Brasil. Accessed October 18th, 2018. https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Guajajara.
  3. “Guajajara in Brazil.” Joshua Project. Accessed October 18th, 2018. https://joshuaproject.net/people_groups/11951/BR.
  4. Vocabulário Guajajara.” Vocabulário e dicionários de línguas indígenas brasileiras. Accessed October 18th, 2018. http://www.geocities.ws/indiosbr_nicolai/guajajara1.html.

 

Notas de rodapé:

[1] Eu também encontrei esta aldeia usando o Google Maps.

[2] “Guajajara,” Povos Indígenas do Brasil, accessed September 26, 2018, https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Guajajara.

[3] “Vocabulário Guajajara,” Linguas Indígenas Brasileiras, accessed October 18th, 2018, http://www.geocities.ws/indiosbr_nicolai/guajajara1.html.

[4] O texto que me inspirou a escrever esta parte está disponível aqui: http://www.language-museum.com/encyclopedia/g/guajajara.php.

[5] “Guajajara,” Povos Indígenas do Brasil, accessed September 26, 2018, https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Guajajara.

[6] Guajajara in Brazil,” Joshua Project, accessed October 18th, 2018, https://joshuaproject.net/people_groups/11951/BR.