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Krenak: Uma História de Trauma e Resiliência

Krenak: Uma História de Trauma e Resiliência

por Bruno Fernandes

30 Novembro 2018

No seu filme Krenak (2017), o realizador Rogério Correia apresenta os Borum (autodenominação dos Krenak) e sua experiência coletiva carregada de sofrimento através de personagens como Douglas Krenak e sua família. O filme revisita as várias fases do genocídio desse povo que, apesar de ser declarado extinto várias vezes, permanece hoje com pouco mais de 400 pessoas. Apesar do filme ser feito depois da “morte” catastrófica do Rio Doce, os esforços coletivos dos Krenak deixam-nos com esperança pela sobrevivência da cultura e cosmologia desse povo ferido mas não morto.

O povo Krenak do Rio Doce, MG, tem uma história extensa de exploração, violação, e destruição que tem suas origens no início do século XIX quando o governo português declarou uma série de “guerras justas” com fim de exterminar os Botocudo, dos quais os Krenak são os últimos sobreviventes. Os Krenak eram considerados demônios canibais e, quando a reeducação cristã obrigatória não era suficiente, os oficiais portugueses que tomaram posse da região, escravizaram e mataram quem queriam. Com a união brasileira no poder, a perseguição dos sobreviventes continuou. Terras próximas ao Rio Doce foram distribuídas a mineiros e fazendeiros com o objetivo de explorar os recursos naturais e integrar a região sob o domínio do governo brasileiro. Para reforçar esta política expansionista, o governo instalou postos militares com o propósito de “ajustar” os índios à sociedade brasileira, prendendo, deslocando e exterminando quem resistisse. Tanto a língua Krenak quanto a sua religião passaram a ser proibidas. A tentativa sistemática de matar a cultura dos Krenak chegou ao seu ápice quando o governo militar os expulsou de suas terras.

Os Krenak foram deslocados à força para as terras dos Maxakalí, onde não eram bem vindos. Ali, eles não tinham seus alimentos culturais, e foram fundamentalmente desenraizados de suas terras originais. “Para morrer na aldeia dos outros é melhor morrer na estrada,” diz uma mulher idosa Krenak no filme, lembrando o desespero que afetou o seu povo quando perderam suas terras, que continham os espíritos dos antepassados e onde viviam há milhares de anos. Sem a presença dos Krenak, as montanhas ficaram expostas a serem destruídas, e seus minerais eram lançados continuamente no mercado global–um processo tipificado pelo trem que passa pela montanha todos os dias carregado de material.

Apesar de estarem sem terra, uma condição considerada equivalente à morte por vários pensadores indígenas, e a morte do rio, um elemento central na cosmologia indígena e o pilar das terras originárias, os Krenak ainda conseguem olhar para o futuro. O filme mostra escolas comunitárias que ensinam a língua e transmitem as canções que recontam os mitos sobre a criação do mundo para os Krenaks mais jovens, muitos deles moradores das cidades. Para os Krenak, tanto o Rio Doce quanto o sonho de um dia voltar às suas terras continua vivo. Resiliência é uma palavra que tem a tendência de romantizar o sofrimento de gente marginalizada, mas neste caso é aplicável. Apesar de serem sujeito de genocídio há mais de dois séculos, a comunidade Krenak continua vibrante por causa do esforço coletivo de pessoas como Douglas e numerosas outras pessoas além das que são apresentadas no filme.

 

 

Sobre os Krenak e sua região

Sobre os Krenak e sua região  

Lisa Abascal

30 de novembro de 2018

Ailton Krenak: Libertador da perseguição aos Krenak

Localizados no estado de Minas Gerais, o povo Krenak tem suportado e superado inúmeras adversidades. Começamos pela perda de seus territórios. Os Krenak foram desterrados várias vezes ao longo dos último 500 anos, primeiro, por outros grupos indígenas e, depois, pelo governo. Nos anos 1980s, alguns Krenak conseguiram recuperar parte de suas terras nas margens do Rio Doce. Vinte anos atrás, o sistema judicial brasileiro ajudou o povo Krenak a retomar 4000 hectares do território que eram deles antigamente.

Grande parte da exclusão e dos abusos contra o povo Krenak vêm de preconceitos de séculos atrás. Os Krenak têm suportado muito, desde serem acusados de canibalismo a terem que lutar contra uma coalizão de outras tribos apoiadas pelo governo brasileiro. O resultado foi a dizimação da população, e a maioria dos Krenaks restantes têm alguns ancestrais que pertencem a outro grupo indígena ou étnico.

Ailton Krenak, nascido em 1953, tem sido instrumental em fazer ouvir a história do seu povo pelo público. Enquanto a memória coletiva permanece na tribo, Ailton tem procurado compartilhar a história coletiva dos Krenak. É impressionante como ele consegue manter seu espaço tanto entre seu povo nativo como em sua vida como residente na cidade. Parece que ele é capaz de fazê-lo, porque ele escolhe definir-se em termos de seu pensamento indígena.

Ailton Krenak é um educador do pensamento indígena. Ele compreende que a história de seu povo é definida pela tragédia, mas também entende que isto trouxe o multiculturalismo às pessoas Krenak, uma característica que Ailton utiliza para unificar os membros de seu povo, outras tribos distintas, e os brasileiros, juntos nesta nova coalizão indígena. Para realizar esta ideia, Krenak fala da importância de participar. Ele vota nas eleições brasileiras, mas diz que a prioridade é estar envolvido em sua comunidade, seja qual for esse espaço. Não votar é muitas vezes visto como um problema, mas, novamente, Ailton Krenak recusa sucumbir a este binarismo entre certo ou errado, acreditando que é a intenção de participação, e não o ato único de votar, que importa.

Sua entrevista, “Receber Sonhos” (1989) é uma obra-prima de clareza. Ela ilumina o pensamento indígena para uma audiência sofisticada, algo que é raro num gênero de literatura esmagadoramente infantil. Ailton consegue manter o otimismo para o futuro do povo Krenak, apesar das devastações que eles enfrentaram. Escritor e educador, mas, o mais importante, diplomata, Ailton Krenak tirou um pouco do peso que o povo Krenak tem ressentido durante tanto tempo, dado que eles têm estado em constante conflito com outros grupos desde que existe sua memória coletiva.

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